23 dezembro 2005

Arte, Ciência e Tecnologia. II Parte

As obras expostas no Museu da Ciência e da Técnica compreendem diversos meios de expressão: pintura, instalação, desenho, fotografia e vídeo. O que as une é a reflexão que, de diferentes modos, cada autor estabeleceu com as questões da ciência e da tecnologia. Destaco apenas os projectos que considero mais interessantes do ponto de vista desta relação.











Marta de Menezes - Árvore do Conhecimento, 2004-2005
Cultura de neurónios vivos. Dimensões variáveis.


Marta de Menezes, formada em Artes Plásticas pela FBAUL trabalha desde 1998 na área da Bio Art. «Tree of Knowledge» é o nome do projecto agora apresentado, realizado na Symbiotica, laboratório dedicado à exploração artística do conhecimento científico e às tecnologias biológicas da Escola de Anatomia e Biologia Humana da University of Western Austrália, que consistiu na criação de esculturas com neurónios vivos. Segundo a artista a escolha do material a usar numa escultura determina o modo como a percepcionamos. Neste projecto, quando se questionou sobre esse processo, decidiu que os materiais mais adequados para representar a estrutura tridimensional dos neurónios seriam os próprios neurónios. Diz a artistas que «Ao cobrir uma estrutura de suporte com neurónios vivos, ou ao preencher tubos de vidro com estas células, torna-se possível obter uma representação da [sua] delicada estrutura […], mantendo a sua natureza dinâmica: sempre mudando, estabelecendo novas ligações, eliminando ligações antigas, crescendo, vivendo. […] Estas esculturas são um exemplo de arte que está literalmente viva» http://cultura2000.min-cultura.pt/.














Alexandre Estrela - Cópia do primeiro desenho feito por um computador, 2005. Caneta s/ papel. Dimensões variáveis.

Mas na exposição outros projectos se destacam. A «Cópia do primeiro desenho feito por Computador» de Alexandre Estrela levanta outras questões. As noções de duplicação, apropriação e claro a da reprodutibilidade computorizada.












Frederica Bastide Duarte - Sospiro, 2001-2003. Vidro de Murano soprado. Dimensões variáveis.

Na mesma sala, destaco também a quantidade impressionante de recipientes em forma de alvéolos pulmonares colocados aleatoriamente no chão, que a artista Frederica Bastide Duarte já apresentou no Pavilhão Branco do Museu da Cidade de Lisboa. A noção de múltiplo está também subjacente a este projecto, facto que não é estranho à ligação da artista ao design e a outros projectos desenvolvidos neste âmbito onde o mesmo conceito é empregue.










Paula Prates -Blossom Blast, 2005. Grafite s/ papel. (6) 110 x 150 cm.

A anatomia humana é também usada como referente por Paula Prates. Mas o efeito estilizando dos seus desenhos do coração, fígado e pulmões, gritante em termos de cor e esquartejante em termos visuais, distancia-a, pela descontextualização a que os submete, da identificação referencial fácil permitida pelos alvéolos de vidro anteriores. Interessante é a selecção de cores. O verde, o azul, o rosa e o amarelo são geralmente utilizadas na ciência para definir área que requerem peculiar atenção ou na medicina para definir zonas com alguma patologia.














Susana Anágua - F=Gmm’:r2, 2005. Aço, arame, imanes. Dimensões variáveis.

Já nas esculturas de metal de Susana Anágua, também seleccionada por Leonor Nazaré para os "Sete Artistas ao Décimo Mês" integrada na mostra patente na Fundação Calouste Gulbenkian, são as questões como o equilíbrio e as atracções electromagnéticas, o elemento base. Duas esferas. A que é suspensa a partir do tecto pesa 10 quilos. É o magnetismo que a faz ficar imóvel e apenas a meio centímetro de outra esfera, de menor dimensão, presa por um fio de aço ao chão. No vídeo «Principia I», que a mesma artista exibe, pode ver-se a rotação de uma esfera que é perfurada por uma broca. O espectador é confrontado novamente com o conceito de rotação e o de fragmento de tempo sugerido pelo lopp e pela segmentação entre imagem em movimento e imagem estática.































Nuno Sousa Vieira - An Invisible Hour / Projection, 2005 . Jacto de tinta s/ lona. 293,9 x 312,7 x 78,1 cm.

«An Invisible Hour», instalação de Nuno Sousa Vieira explora as mesmas noções de rotação, neste caso da Terra, durante o período de uma hora. O conceito de tempo é também usado como material do projecto «Despertar Carlos Paredes Coimbra 1925-Lisboa 2004» de Ana João Romana e em «Melancolia» de Tânia Bandeira Duarte. Projectos de minúcia matemática, espécie de diários científicos, o primeiro regista o horário do nascimento do sol durante o período de vida de Carlos Paredes, o segundo, é um indicador melancólico da luminosidade dos dias, expressa a claro e escuro, durante as quatro estações de um ano.














Inês Rebelo - Mauna Kea CCTV (Subaru Catwalk), 2005. Jacto de tinta s/ papel. (2) 112 x 152 cm.

Por fim, outra intenção revela Inês Rebelo. As suas fotografias constituem o registo final dos mecanismos de poder e controle da sociedade actual. As relações de poder actuam como forças que disciplinam e controlam os indivíduos. Para Michel Foucault, na modernidade, à medida que mudaram as relações sócio-políticas e económicas, também as relações de poder se alteraram adequando-se às necessidades do poder dominante. Neste processo complexo, o poder autonomizou-se, prescindindo dos indivíduos. Através do aparato ideológico, burocrático ou bélico, o poder exerce-se, coagindo e fazendo com que os indivíduos se submetam. De acordo com essa concepção, o poder evolui de uma forma rude, apresenta-se hoje de um modo sofisticado e subtil. Neste conjunto de fotografias, essa subtileza é assumida por câmaras que fotografam uma mesma zona ao longo de um período registando/vigiando tudo e todos os pormenores que ocorreram nessa espaço e tempo.